A decisão pela restauração nascia da minha consciência, que indicava ser esse o caminho correto. E esse era mais um dos tantos caminhos que desejaria trilhar pela vida.
A situação da área degradada estava atrelada aos ditames de uma Lei Federal, tão bonita no papel quanto distante de se tornar realidade em um país tão devastado. Ao menos era o que eu pensava, talvez de forma não corretamente alinhada aos estudos sérios, que com certeza existiam e eu ainda não os conhecia.

Ou seja, há um passado de prática de derrubadas de florestas, poucos cuidados com os rios, sempre avançando no desmatamento sem preocupações com a preservação. Apenas se foi desmatando, construindo de um lado e destruindo do outro. Os cuidados com a preservação sempre sendo sinônimo de desperdício, de falta de aproveitamento racional do solo e outras razões.
Na memória eram poucos os registros que eu tinha sobre as ações de recuperação exemplar: a floresta da Tijuca, no Rio de Janeiro, as Serras da Cantareira e do Mar, em São Paulo e da luta dos seringalistas em Xapuri. Eu estava ainda longe de conhecer exemplos como o de Ernst Götsch e de outras iniciativas assim.
De fato, estava pouco informado em 2004 e nesse jeito enfrentava os dilemas internos decorrentes entre “restaurar” e o pensamento comum vigente na minha micro comunidade, que iniciativa desse tipo seria “anular” o bom uso de um pedaço de terra. E fazia sentido estar assim dividido, porque eu era pobre diante dos gigantes proprietários de terras deste país. E a maioria, salvo exceções de sempre, com pensamentos nada ecológicos e avançando agora pela Amazônia afora. Extensões gigantes de florestas desaparecendo, cedendo lugar ao gado, à soja e a outras culturas extensivas. Era o que eu lia.
Os dez alqueires agora sob meus cuidados, com um terço dessa área sob influência da erosão, eram exatamente “nada” diante das gigantescas áreas desmatadas neste país. Apesar das boas leis.
Qual sentido em tentar restaurar um pedaço tão pequeno e isolado? Sem áreas anexas de mata que pudessem, ao menos, formar um corredor ecológico para sobrevivência mínima de vegetação e animais?
A opinião geral, com quem eu me aconselhava, seguia na direção de ajeitar um pouco a área degradada, apenas como forma de melhor aproveitar cada palmo de solo para formar pastagens e para evitar multas. Avançar sobre o que era possível e tirar o máximo proveito.
Diante desse cenário, por que então, ora bolas, caberia a mim preservar?
Por que preocupar-me com uma área minúscula no contexto geral, porém o único pedaço que às duras penas, com o fruto de salário de anos, eu adquirira?
Porque a vontade de recompor, de ver a mata ressurgir e com ela a água e a vida mais intensa, surgia em mim como um dever humano, uma dívida a ser paga em benefício dos futuros humanos deste planeta. Muito mais do que seguir a Lei.
E foi assim que em 22 de junho de 2005 os papeis com os estudos e propostas para conter a erosão chegaram.
A proposta técnica indicava a construção de 5 pequenos barramentos ao longo da vossoroca, como forma de diminuir a velocidade das águas nas épocas de chuva. Cada pequena represa ficaria num declive de 3 metros uma da outra e a água ao final desaguaria no córrego Guabiroba de forma mais limpa, diminuindo o assoreamento já existente. A área a ser trabalhada equivalia a 47.120 metros quadrados, das quais as represas representariam 10.595 metros.
Paguei pela elaboração desses estudos porque eram necessários, sem a interferência de um engenheiro e conhecedor da legislação, seria muito difícil seguir adiante na burocracia. Enquanto poupava para pagar esses estudos, pensava nos gastos que as obras significariam: movimento de terra e horas de máquinas.
Investimento isso?
O levantamento indicava que doze árvores existiam no lugar na erosão e deveriam ser retiradas para o serviço de reparo do solo: 3 bacuris, 2 embauvas, 1 aroeira pequena, 1 farinha seca, 1 figueira, 1 mamica de cadela, 1 lixa, 1 cafezinho e 1 goiabeira.

Em 17 de junho de 2005 firmei documento declarando que a recuperação aconteceria numa área de preservação permanente, na forma da lei, estando o terreno destituído de maciço florestal. O requerimento para licenciamento da obra, com toda a documentação, foi protocolado em 29 de junho de 2005 para análise do Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais.
Junto foram declarações, mapas, planta planialtimétrica, relação de árvores existentes no local, memorial descritivo, tudo nos mínimos detalhes e evocando artigos de lei e regras que deveriam ser observadas.
Protocolo feito, começou o período de espera da decisão das autoridades.